quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

LENDO MULHERES NEGRAS


Ana Dos Santos | Rio Grande do Sul / Porto Alegre

Poemas: Poenegro
Temática: Literatura Negro Brasileira
Ano: 2018

O negro vive
numa noite escura,
uma noite interminável
que dura uma vida inteira
Às vezes é dia,
faz sol
Às vezes chove,
lágrimas
Mas,
parece sempre nublado
e a noite escura
ressurge
Anda prevenido, sempre,
mas, o racismo lhe dá
uma rasteira
Nunca se está preparado
para a maldade dos homens
e das mulheres
brancas
Fica sem reação
estupefato
Não consegue falar
nem reagir
E se é dia,
vira noite
escura,
de novo
O negro sobrevive
em outra noite escura
tão escura quanto a sua cor
O mistério das estrelas
e da lua
é o seu secreto amor

#lendovocês #lendomulheresnegras #escritorasnegras
— com Ana Dos Santos.



BIENAL BLACK BRAZIL ART
 
Em meio as diferentes formas de diminuir invisibilidades, mulheres artistas compartilham experiências e protagonismo. O nosso muito obrigado a Ana Dos Santos e a Terezinha Malaquias, Aline Andreoli e a todos os que estiveram presentes. Patrícia Brito
Performance "Poerotisa"







Ana Dos Santos, Veralindda Menezes, Afroativos e Priscila Bastos


SARAU FEMINISTA

Ana Dos Santos, Daiana Santos, Fátima Soares e Karine Miranda Campos

Poemas novos saindo do forno!
De manhã, o lance é correr as livrarias, Baleia, Bamboletras, Taverna, e encher as sacolas com Ronald Augusto, Marília Kosby, Eliane Marques, Ana Dos Santos, Luiz Maurício Azevedo, Natália Polesso, Diego Grando, Fernanda Bastos, além de perguntar pra Nanni, pro André, pro Milton, quais as novidades da Figura de Linguagem, da Zouk, da Taverna, da Arquipélago, da Dublinense. E não é que é um universo de autoras, autores, histórias, poemas! Alguém pode viver a vida toda nesses mundos

https://literaturars.com.br/2019/12/02/guto-leite-um-dia-na-vida-de-joao-schmidt/?fbclid=IwAR0IiEohSTzxAOd1MATImK60Nf4uSyc07W-OJ9NwyoBDFMnAtqtXkxTNnfE





Assista o poema "A puta que te pariu" poetisado pela escritora Taiasmim Ohnmacht e a atriz Carmem Lima https://www.youtube.com/watch?v=BbVFlm2ZvPU&feature=share&fbclid=IwAR1joF1EKcbjMg4Ge67e34vNonT5LvNw8jptp3YUTOxO9GYxLlEaNtApcgY

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

MULHERES INSPIRADORAS

   Obrigada pelo convite da escola Vera Cruz, na pessoa da professora Ketlin Pedroso, para encerrar a Semana da Mulher.
   Me sinto muito honrada de ser lembrada por ser uma MULHER INSPIRADORA!
   Meu nome é Ana e eu sou professora, pesquisadora e escritora.
   Na minha vida tive muitas mulheres que me inspiraram: 
   Minha avó Martina, que foi uma das primeiras mulheres a votar na cidade de Alegrete. Minha avó era dona de casa, mas fez questão que todas as filhas estudassem para ter um futuro diferente do que ela teve.
   Minha mãe Iolanda, que é professora de Filosofia e foi perseguida durante a Ditadura militar e convidada a se retirar de Alegrete, vindo morar em Porto Alegre onde trabalhou na Secretaria de Educação.
   Minha mãe e meu pai, Gléber, desde criança me ensinaram a ter orgulho de ser negra. Hoje vejo que fui privilegiada porque muitas famílias negras não sentem esse orgulho. O racismo é uma doença social tão perversa que ensina os próprios negros a se odiarem e desejarem não serem negros.
   Junto com o orgulho negro, aprendi a ter referências de pessoas negras que inspiraram meus pais: Martin Luther King, Bob Marley, Sammy Davis Jr. e os escritores norte-americano Alex Baldwin e o brasileiro Cuti e o músico Wilson Simonal.
   Todas essas referências me ajudaram a ser uma pessoa forte e resistente diante do racismo. Principalmente no ambiente escolar, onde as crianças já vêm de casa aprendendo a odiar os negros. Mas, o pastor Martin Luther King sempre diz: "se pudemos ensinar a odiar, podemos ensinar a amar!"
   Eu comecei a escrever com 9 anos, tinha um diário onde expressava meus pensamentos e sentimentos. Com 16 anos comecei a escrever poesia. Sempre gostei muito de ler, e a leitura é a principal ferramenta para quem deseja escrever.
   Eu sempre fui uma das melhores alunas na escola e sempre estudei em escolas públicas. Um dia, realizei meu sonho e ingressei na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
   Então, foi justamente nesse lugar que mais sofri racismo em minha vida. Na minha turma com 100 alunos, tinha apenas dois colegas negros.
   Por mais forte que você seja, chega um momento que o racismo começa a te fazer sofrer. Por ser uma das melhores alunas, os professores começaram a me discriminar e o racismo adoece. Até que procurando uma bolsa de estudos, encontrei uma professora negra: Maria da Graça Gomes Paiva.
   Essa mulher é uma inspiração na minha vida! Trabalhando com ela aprendi muito sobre intelectuais negros e o conceito de Empoderamento, que trata do acesso ao  poder político para as minorias étnicas. O Empoderamento é um processo coletivo de reparar todas as perdas da população negra devido ao processo de escravização.
   Me formei e continuei estudando. Em 2003, surgiu uma lei educacional que trata da Obrigatoriedade do Ensino da História e da Cultura Afro-brasileira e Indígena. Um conteúdo que eu nunca tinha estudado e tinha muita necessidade de aprender a história do meu povo.
   Comecei a dar aula de Literatura, e essa disciplina é uma das que está compreendida como ferramenta de ensino dessas culturas.
   Tive que colocar meu filho na escola e fui procurar minha Pós-Graduação. Fiz duas especializações em História e Cultura Afro-brasileira e Indígena. Aprendi muito sobre a história da África antes da invasão da Europa. Aprendi também sobre nossos heróis negros brasileiros: Zumbi e Dandara dos Palmares. Eles eram líderes do maior quilombo da América Latina que resistiu durante 100 anos contra a escravidão no Brasil.
   Aprendi que quem lutou pela sua liberdade foi o próprio negro, que arrancado do seu continente foi sequestrado e tornado escravo na América. O negro resistiu, desobedeceu, fugiu, lutou. Muitos trabalharam para comprar suas alforrias.
   Aprendi que após a abolição da escravatura nada foi feito para as pessoas que construíram esse pais. Aprendi que mesmo livres, eram proibidos de frequentar a escola.
   No primeiro ano em que lecionei, pedi para os alunos pesquisaram autores negros brasileiros. Muitos não sabiam que um dos maiores escritores negros do país é negro: Machado de Assis. Por quê "embranqueceram" ele nas fotos?
   Aprendi que houve uma política de embranquecimento da população brasileira, pois se deram conta que mais da metade da população era e continua sendo negra. E o país com mais negros do mundo, depois da Nigéria, é o Brasil!
   Nessa pesquisa os alunos também encontraram o maior poeta negro gaúcho: Oliveira Silveira! foi ele quem criou o dia 20 de novembro, dia da morte de Zumbi dos Palmares e dia Consciência Negra.
   A Consciência Negra é para negros e brancos. Para os negros conhecerem as suas origens e os brancos aprenderem a respeitar!
    No final da minha Especialização, descobri uma escritora negra que nunca tinha ouvido falar: Carolina de Jesus! Vocês sabiam que na época que ela lançou seu livro "Quarto de Despejo: Diário de uma favelada", o seu livro bateu o recorde de vendas no Brasil e foi traduzido para mais de 14 países?
   Eu também não sabia!
   Então foi aí que comecei a pesquisar as Escritoras Negras Brasileiras. 
   Minhas alunas sempre reclamaram que na escola só se estudavam homens escritores! E eu reparei que só tinham duas escritoras no currículo: Clarice Lispector e Cecília Meireles. Com a minha pesquisa coloquei Carolina de Jesus no currículo e qual foi a minha surpresa? Foi o livro que os alunos mais gostaram e até choraram na apresentação.
   Carolina de Jesus nos relata no seu diário que é uma mulher negra e pobre que se viu obrigada a morar numa favela e teve que retirar do lixão o material para o seu sustento. Ela era uma catadora de papel.
   Carolina tinha um sonho: Ela queria ser escritora!Mas não pôde terminar os estudos porque tinha que trabalhar. E não tinha dinheiro para pagar uma editora.
   Ela criou sozinha seus três filhos e vivia sempre com fome e com frio. Para esquecer suas dores ela escrevia um diário. Também era no lixo que ela encontrava o que ela chama de maior riqueza: os livros!
   Como numa história de contos de fadas, Carolina foi descoberta por um jornalista, e do dia para a  noite, ficou rica e famosa!
   Como que eu não conhecia essa escritora? Por que ela foi esquecida, apagada, invisibilizada na história da Literatura? Foi por conta da sua escrita com erros de ortografia ou a alta elite literária acusou que "aquilo" não era literatura?
   Eu fico imaginando o que diriam essas pessoas quando Carolina entrou para a lista de Leituras Obrigatórias de uma das melhores universidades do país e do mudo, a UFRGS? Carolina é uma mulher inspiradora.
   Eu não pretendo ser rica nem famosa como foi Carolina, mas também sou uma escritora negra com um livro publicado. Muitas pessoas brancas não gostavam dos meus poemas que falam sobre racismo e machismo.
   Minha carreira literária despontou quando eu encontrei o coletivo de poesia negra, Sopapo Poético. Esse coletivo se reúne mensalmente num sarau para ler somente escritores negros. Ali eu fui recebida e compreendida na minha "Escrevivência", E metade do grupo é formada por mulheres escritoras com eu.
   Eu sou uma pessoa esperançosa e nos últimos 5 anos estou vendo uma pequena mudança, lenta, mas muito bonita na vida das mulheres negras.
   Antes, nós não podíamos estudar, agora somos as professoras!
   Antes, diziam que nós só tínhamos talento para cozinhar ou sambar. Agora somos intelectuais.
   Antes, os livros de História do Brasil só falavam do negro na escravidão!
   Agora, nós estamos reescrevendo a História.
   Obrigada!
Ana Dos Santos