terça-feira, 24 de novembro de 2015

Na última edição de 2015, o SOPAPO POÉTICO – Ponto Negro da Poesia tem a grande satisfação de lançar a sua primeira antologia poética, reunindo poemas de colaboradores e frenquentadores do sarau. Seguindo o caminho trilhado pelos mestres, os poetas "sopapeiros", de forma compacta e intensa, apresentam seus escritos numa publicação literária coletiva, transmitindo, em doses concentradas, um pouco da energia que é renovada mês a mês no encontro de “vivas vozes”.
Participam dessa antologia: Delma Gonçalves, Jorge Fróes, Fátima Farias, Lilian Rocha, Sidnei Borges, Paulo Ricardo de Moraes, Renato Borba, Maria do Carmo, Jorge Onifade, Pâmela Amaro, Mamau de Castro, Leandro Machado, Renta Moura, Duan Kissonde, Ana do Santos, Silvana Conti, Nádia Lis Severo, Jair Romaria e Isabete Fagundes.

O evento será realizado no dia 24/11, terça-feira, às 19h, no SIMPA - Sindicato dos Municipários de Porto Alegre, na Av. João Alfredo, nº 61 - ao lado do Largo Zumbi - Porto Alegre/RS.

O encontro inicia com a exibição de vídeos do CINE KAFUNÉ e com a FEIRA AFRO, que integra o empreendedorismo negro, com exposição e venda de artesanato, roupas, discos, livros e diversos acessórios. Paralelamente ao sarau, acontece o SOPAPINHO, onde os pequenos desenvolvem atividades acompanhadas de educadoras.

SOPAPO POÉTICO - Ponto Negro da Poesia
36ª EDIÇÃO - NOVEMBRO/2015
Lançamento do Livro do Sopapo Poético
Quando: terça-feira, 24 de novembro, às 19h
Onde: SIMPA - Sindicato dos Municipários de Porto Alegre
Av. João Alfredo, nº 61 - ao lado do Largo Zumbi - Porto Alegre/RS.
ENTRADA FRANCA
9365-3315 - 8428-2804 - 9317-6497 - 9218-5449

Realização:
ANdC - Associação Negra de Cultura

Apoios:
Cine Kafuné
SINDIPETRO-RS - Sindicato dos Petroleiros
SIMPA - Sindicato dos Municipários de Porto Alegre
AECPARS – Associação das Entidades Carnavalescas
Escola de Samba Acadêmicos da Orgia
Boteko do CANINHA (Areal da Baronesa)

terça-feira, 17 de novembro de 2015

"...QUANTAS ANÔNIMAS GUERREIRAS BRASILEIRAS!"  (Oliveira Silveira)

   Na minha busca por uma identidade afro-brasileira, encontro nos escritos de Lélia Gonzales a prova de que existe, sim, uma intelectual negra brasileira que pensa em nós como mulheres e nos constitui como elemento central e fundador de um país chamado Brasil. Lélia, uma intelectual, ativista aguerrida na luta antirracista e antissexista, teve uma ascendência social e intelectual que não a impediu de questionar o pensamento ocidental e ressignificar o feminismo, chamando a atenção para os fatores raça, gênero e classe.
  Nos anos 80, ela ressaltava que dentro do Movimento Negro era necessário abrir um debate para uma maior visibilidade das mulheres negras como sujeitos políticos. A verdadeira emancipação começaria a partir do momento em que nós, mulheres falássemos por nós mesmas e não fôssemos tratadas como objeto de estudo: "Nós negros estamos na lata de lixo da sociedade brasileira, pois assim determina a lógica da dominação. Exatamente porque temos sido falados, infantilizados, assumimos nossa própria fala, ou seja, o lixo vai falar. E numa boa!"
   Num texto publicado no Jornal Mulherio, ela faz a provocação: "E a trabalhadora negra cumé que fica?" Estamos nos anos 80 e a condição das mulheres negras como trabalhadoras domésticas ainda não está contemplada pelas leis trabalhistas criadas em 1930 por Getúlio Vargas. Nos anos 40, o próprio Movimento Negro cria a Associação das Empregadas Domésticas para garantir algumas condições mínimas de saúde, e dessa forma começa a "empoderar" algumas delas com cursos de datilografia e secretariado. Em 2013, século XXI, a PEC das Domésticas traz de volta todo o "chorume" da "casa-grande": não querem assinar a carteira, nem pagar os direitos trabalhistas para "aquela que já faz parte da família"...Não esqueçamos que muitas até hoje não assinam sua carteira porque não sabem ler...
   Lélia faz uma reflexão sobre a estrutura de trabalho no Brasil construída em cima da escravidão: "a trabalhadora rural de hoje não difere muito da escrava do eito de ontem, a empregada doméstica não é muito diferente da "mucama" de ontem, o mesmo poderia dizer-se da vendedora ambulante, da "joaninha", da servente ou trocadora de ônibus e "escrava de ganho de ontem".
   Ela também fala do espaço privado e o espaço público que a negra ocupa: dentro de casa, o quartinho da empregada ( reprodução da senzala) e fora de casa a "mulata ' do Carnaval: " as formas particulares de violência, abuso e assédio sexual que vêm desde a Colônia quando os homens iniciavam sua vida sexual com a negra e com a branca fazia sexo apenas para fins reprodutivos.
  É justo nesse ponto da análise, que Lélia faz o que é chamado em filosofia de "uma dobra deleuziana", ou seja, ela contorna essa análise de uma perspectiva chamada "resistência passiva". Sim, nós, negras, resistimos aparentemente pela "passividade", mas dessa forma, imprimimos uma identidade cultural no Brasil que está no nosso DNA até os dias de hoje. Somos filhas e netas de Dandara, aquela que preferiu se matar a ser escravizada de novo. Somos quilombolas e herdamos dessa resistência, a sagacidade de um povo: "Enquanto escrava do campo (café e cana) ela estimulou a revolta, a fuga e a formação de quilombos. Ela lutou contra as expedições militares, educou os filhos contra a escravidão, a colônia e o racismo."
   Pensando em cultura como um elemento de conscientização política e a valorização de uma identidade negra, ela chega num ponto crucial: "Enquanto mucama ou ama-de leite, mantinha um contato direto com os senhores, reproduzindo a ideologia senhoral e "fazia a cabeça do senhor" numa resistência passiva e profunda. Ela fazia o papel de "Mãe Preta" e nessa profundidade ela criou uma espécie de "romance familiar" cuja importância foi vital na formação dos valores e crenças do nosso povo. Ela, conscientemente ou não, passou "as categorias" das culturas negro-africanas de que era representante. Ela africanizou o Português, criando assim o "Pretuguês".
   A atualidade do pensamento de Lélia me emociona e me toca profundamente enquanto minhas irmãs marcham em rumo à Brasilía, na Primeira Marcha das Mulheres Negras, em 18 de novembro de 2015. Transcrevo aqui uma realidade da qual faço parte: as duplas e triplas jornadas às quais as mulheres negras conhecem tão bem e que nos diferem de nossas irmãs brancas. O Feminismo AfroLatinoAmericano ou a Amefricanidade trata sobre as mulheres na diáspora africana na América Latina. Nosso Feminismo Negro é o "Womanism" de que falava Alice Walker, é o "Mulherismo, de mulheridade. Mulheridade é a construção do sexo junto com o parceiro ou parceira: "Eu sou mulher junto com o outro, é o sexo além do orgasmo, é o devir, o vir a ser. É a solidariedade.
   "Hoje enquanto mãe e companheira continua sozinha a batalhar o sustento dos filhos, enquanto o companheiro, objeto da violência policial, está morto ou na prisão, ou então desempregado e vítima do alcoolismo. Em matéria de dupla jornada ela é "expert" (acorda mais cedo, deixa a comida pronta, lava roupas, leva o filho ao médico). ela sempre dá um jeito de ir o Samba (exercitar o lúdico). Curte um Carnaval e é protagonista nessa festa. Vai ao terreiro ou centro exercer a fé nos Orixás. Tem medo de barata, mas não tem medo da polícia e tem consciência política."
   Essas são as anônimas guerreiras brasileiras, grupo do qual faço parte e tenho muito orgulho de pertencer!
Ana Dos Santos
  

domingo, 8 de novembro de 2015


PROTAGONISMO DAS MULHERES NEGRAS E MOVIMENTOS SOCIAIS
mesa que ocorreu dia 07/11/2015 na 61ª FEIRA DO LIVRO DE PORTO ALEGRE

   Inicio a minha escrita trazendo a palavra SANKOFA (pertencente ao conjunto de ideogramas dos povos do oeste da África) que significa: a sabedoria de aprender com o passado para melhorar o presente e construir o futuro.
   Eu gosto de meditar sobre o sentido das palavras, então, vamos ao título da nossa mesa:
PROTAGONISMO - é o processo de protagonizar, ser o ator principal, ter voz ativa.
MULHERES NEGRAS - mulher afrodescendente que se auto-declara negra.
MOVIMENTOS SOCIAIS - ação coletiva de setores da sociedade para defesa ou promoção de objetivos e interesses que visam a transformação da ordem estabelecida.
   Eu sou um Movimento Negro, eu sou uma negra em movimento, à partir do momento que eu deixo o meu lar, eu sou uma negra em movimento. À partir do momento em que eu convivo em sociedade, eu sou um Movimento Social.
   Quero contar um pouco sobre as mulheres protagonistas da minha vida: minha avó Martina, que teve sua vida documentada em vídeo por mim no meu Trabalho de Conclusão na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, orientada pela professora da disciplina de Literatura Oral: Ana Liberato. Minha avó era uma matriarca, contadora de histórias que estudou até a 4ª série e fez questão que as filhas estudassem. Foi uma das primeiras mulheres a votar na cidade de Alegrete.
   Minha mãe Iolanda, professora de Filosofia, deixou de lecionar a disciplina por motivos de força maior: a Ditadura brasileira que considerou essa ciência perigosa e a baniu dos currículos escolares por muitos anos. Ela e meu pai Gléber sempre se assumiram como negros. Buscavam através das lutas dos Direitos Civis nos Estados Unidos, referências e lideranças para suas consciências. Literatura, música, cultura trouxeram para eles a negritude necessária para enfrentar os preconceitos.
   Foi na nossa estante de livros que encontrei mais tarde na minha busca, a biografia do músico Sammy Davis Jr. : "Yes, I can" traduzida: "Sim, eu posso!", mote da campanha presidencial de Barack Obama. Também encontrei livro de contos do escritor paulistano Cuti, onde mostra as problemáticas e controvérsias do Movimento Negro no Brasil.
   Sofri racismo no jardim da infância, trauma que acomete a maioria das meninas negras no Brasil. Com o apoio de minha mãe, construí um sentimento de autoestima e amor próprio. Fiz o cursinho pré-vestibular Zumbi dos Palmares, onde além dos conteúdos das provas, tínhamos aulas sobre cidadania, direitos e cultura. Segui meus estudos até sofrer racismo novamente na Universidade, no curso de Letras, partindo dos professores. Era só eu e mais uma menina negra no curso todo. Mais uma vez, uma fada madrinha me auxiliou: Maria das Graças Gomes Paiva, uma professora negra, me apresentou o conceito EMPODERAMENTO. Através dele, eu deveria buscar meu aperfeiçoamento intelectual e a luta pelos meus direitos.
   Eu fui alfabetizada em casa e ao ganhar um diário da minha mãe, aos 10 anos, comecei a escrever e não parei mais. Ganhei meu primeiro concurso de poesias na Universidade. À partir daí, comecei a mostrar meus poemas para o mundo através de concursos, antologias e da venda de cartões com poemas e imagens. Participei de saraus e performances poéticas e criei um jornal digital de poesia.
   Eu sou protagonista da minha Literatura. Nos meus poemas falo de mim, das minhas dores e paixões.
Ana Dos Santos